Na minha terra, a Trofa, a mitologia social-democrata local alude a Luís Marques Mendes como “o pai do concelho“. Motivo? Em 1998, quando a elevação a concelho acontece, Marques Mendes era o líder parlamentar do PSD e apoiou as aspirações dos trofenses. Claro que, como poderão imaginar, o interesse de Marques Mendes não residia propriamente nas aspirações independentistas dos trofenses mas antes no facto de Santo Tirso, a autarquia que governava a Trofa, ser território socialista. Juntou-se o útil ao agradável.
Por este motivo, que mais não é do que uma fábula criada pelo PSD local para social-democratizar uma luta que foi de todos os trofenses, socialistas incluídos, todos os anos tenho que levar com a treta do “pai da Trofa“. No ano passado, quando se celebravam 15 anos desde a criação do concelho, o distinto Marques Mendes veio cá dar o ar da sua graça e foi recebido pelas hostes da direita local em apoteose. Uma coligação entre PSD e CDS-PP tinha acabado de retirar os socialistas do poder e o momento não podia ser mais oportuno para difundir esta fantasia.
Vem isto a propósito de uma certa sacralização da figura de Marques Mendes na sociedade portuguesa, exímio teórico do regime a porta-voz não-oficial do governo, que, à semelhança do que acontece noutros pontos do país, é algo naturalmente aceite por muitos dos meus conterrâneos trofenses. Marques Mendes o fazedor de opinião, Marques Mendes o governante incorruptível, Marques Mendes a referência. Mas hoje gostaria de vos falar de Marques Mendes, o gajo que foi apanhado em escutas telefónicas a pedir favores ao antigo director do IRN, António Figueiredo, hoje em prisão preventiva. Aparentemente, Marques Mendes o facilitador, foi apanhado a pedir ao director do IRN para desbloquear dois processos para a obtenção de vistos gold. Os casos remontam a Agosto e Outubro deste ano. Resta saber para qual dos 8 telemóveis de Figueiredo terá Marques Mendes telefonado.
Não é a primeira vez que vemos Marques Mendes associado ao escândalo dos vistos gold (entre outros). Ainda recentemente, o Diário de Notícias fez desaparecer uma notícia que dava conta da ligação entre o consultor Marques Mendes e a Abreu Advogados, escritório lisboeta que tratou um em cada três processos de vistos gold, e que o João José Cardoso conseguiu resgatar de desaparecimento precoce. Para além desta situação altamente suspeita, a relação entre Marques Mendes e António Figueiredo era já conhecida, desde os tempos de colegas na universidade até à sociedade JMF Projects & Business Lda., onde o “coronel” social-democrata é sócio de Luísa Figueiredo, filha do mesmo António Figueiredo a quem Marques Mendes terá pedido dois “pequenos” favores, numa empresa que nem de propósito está também implicada no escândalo dos vistos gold.
Marque Mendes devia agradecer a José Sócrates. É que desde que o infame ex-primeiro-ministro foi detido e posteriormente preso preventivamente que o caso dos vistos gold deixou de estar em grande plano nos meios noticiosos. A coisa parece estar a ser tão abafada que até o DN se viu forçado a retirar uma notícia. Até porque o caso atinge uma quantidade considerável de pessoas próximas do poder que estão implicados no caso, de Marques Mendes a Miguel Macedo, também ele sócio da JMF Projects & Business Lda. O site do Bloco de Esquerda avança mesmo que, nas escutas em que Marques Mendes foi apanhado, o comentador terá afirmado que falaria com Pires de Lima caso fosse necessária uma declaração do ministério da Economia. Sempre bom poder contar com amigos bem colocados. Marques Mendes pode ser pequeno mas chega sempre onde quer. E ninguém o apanha. Não há pai para ele.