Artigo inicial do tópico:
http://news.investors.com/ibd-editorials-on-the-right/010515-733227-crusade-against-income-inequality-can-rip-country-apart.htmUma sociedade perfeitamente nivelada e sem o mínimo de diferenciação nos rendimentos é uma utopia. Num horizonte muito afastado poderão as sociedades chegar a um patamar muito "justo", mas eu sou bastante céptico. A natureza humana dificilmente permitirá tal situação. Há demasiada variedade de interesses, de culturas, de formas de ver a vida, de níveis de ambição, de determinação entre muitos outros factores que diferenciam as pessoas.
Todo esse passado individual e colectivo influenciará o "destino" dos indivíduos e colectivos. Logo o autor do artigo levanta pontos que sem dúvida são relevantes. O principal será que a igualdade de oportunidades (naquilo que o estado pode provir, já que nas questões familiares tal será impossível) não garantem igualdade de resultado final.
No fundo tem ligação com o que referi no meu post inicial. Uma sociedade capitalista/meritocrata/democrata (e penso que num panorama geral a maioria concordará que é o melhor sistema que se conhece) gerará sempre pessoas "remediadas". Médicos, engenheiros, donos de PMEs, de micro-empresas, prestadores de serviços com saída, funcionários estatais de quadros médios/altos, quadros médios de grandes empresas, etc. Essas pessoas como já têm rendimentos razoáveis, já podem ser alvo de inveja, já serem vistos com pessoas que têm rendimentos excessivos.
Mas se os empregos/actividades são justo(a)s, não baseadas em cunhas/favorecimento/corrupção, eu não tenho problema nenhum com a situação. É o famoso mercado a funcionar.
Em empresas de maior calibre que as anteriores (e respeitando a situação de os rendimentos serem lícitos) já começamos a ter pessoas com maiores rendimentos. É o fulano que consegue comprar o seu Porsche ou Jaguar novo, pode ter uma grande casa em excelentes sítios, consegue dar uma vida excelente aos filhos. Muita gente colocará totalmente em causa este tipo de rendimentos.
Quem seguir um raciocínio à la Ayn Rand concordará; um socialista torce o nariz, um comunista entra em convulsões. O argumento da Rand tem validade, no sentido de que se aquele empresário produz algo que agrada a tanta gente, que facilita a vida a tantos, que nada mais justo que essa pessoa tenha um excelente rendimento. Ele foi "altruísta" ao auxiliar muita gente, essas pessoas estão satisfeitas e acham justo pagar o valor pedido pelo produto. Eu aceito esse raciocínio, se não houver receitas "ilegais". Ela argumentaria que não poderia existir favorecimento estatal porque na perspectiva dela o estado deve ter um papel mínimo e colectar pouco capital aos contribuintes logo essa questão estaria minimizada ou até debelada.
A questão é que mesmo em empresas de médio porte não se favorece apenas cedendo capital. Pode existir favorecimento por aquiescência, por fechar os olhos, por alterações/favorecimentos legislativos, etc.
Mas por momentos esquecendo estas questões e imaginando que tudo funciona de forma perfeita e impoluta, são os mercados a funcionar, logo os potenciais rendimentos serão "justos". A desigualdade de rendimento para membros da sociedade com rendimentos baixos (apoios estatais, salário mínimo, salários poucos superiores ao mínimo) deve-se às regras de funcionamento do próprio mercado, sendo o mesmo o melhor sistema para gerar o melhor nível de vida para o maior número de pessoas possível que se conhece.
Até aqui eu aceito em parte (grande parte) os argumentos, com as ressalvas que fiz anteriormente.
A questão é quando passamos para níveis estratosféricos. Pessoas com capitais acumulados (pessoais) na casa de biliões. Pessoas que usufruem de rendimentos brutais apenas por serem "rentiers". Um rentier com capacidade de lobby e inside info é tudo menos aquilo que o mercado "prega". Que benefício é que este tipo de elementos gera para usufruírem de semelhantes rendimentos? (seguindo o raciocínio da Rand). Este tipo de elementos da sociedade na crise de 2007 teria perdido quantidades brutais de capital caso o mercado tivesse funcionado. Aposto que muitos teriam quantidades brutais de obrigações ligadas a seguradoras, bancos e bonds (e como uma Grécia dá mais % que uma Alemanha..... ). Logo houve um bailout massivo não apenas a governos, mas também a estes elementos, que teriam perdido rios de dinheiro.
Mas nesse caso o funcionamento do mercado já não interessa.
Mas mesmo pegando em potenciais bilionários que estão no modelo da Rand. Proporcionam benefícios a centenas de milhões de pessoas logo terão rendimentos astronómicos. Mas será necessária uma estrutura tão gigantesca e poderosa para beneficiar essas pessoas? Não poderiam essas mesmas pessoas obter os mesmos serviços através de várias empresas? (que ainda assim seriam grandes).
Tanto capital significa poder, e todas as formas de concentração de poder deveriam assustar, tal como a história profusamente ensinou-nos. Eu pessoalmente não vejo com bons olhos que tão poucos indivíduos tenham tanto poder.
E o raciocínio de que os mercados recompensam duma forma justa aquilo que cada elemento "dá" a sociedade ao participarem no mercado e que basicamente isso é o motor da evolução social também é bastante falível do meu ponto de vista. Explica muito, é verdade e eu assumo-o sem problemas, mas não escrevo tal em granito, pois há muitas excepções.
O Inc refere que o paradigma actual remonta à organização da agricultura.
Alguma vez um elemento da sociedade como Newton poderia ser recompensado pelo legado que nos deixou? Pensando pelo prisma de que se beneficia muita gente um rendimento astronómico é justificável, todos nós ainda estaríamos a pagar "royalties" ao Newton (estou a brincar).
Charles Goodyear penso que morreu relativamente pobre (tenho assim de memória) e no fundo facilitou a vida de milhões e pessoas (embora não no seu período temporal, admito).
Penso que se pensarmos pelo prisma de ajudar/melhorar a vida de milhares ou milhões de pessoas o contributo dos cientistas é brutal e a recompensa que tem do mercado é baixa. Lá está, em muita coisa o mercado falha.
O famoso Cristiano Ronaldo recebe uma pipada de massa do Real. É justo? Dirão que sim, que vende n camisolas, que dá audiências e logo o Real recebe mais das televisões.... o problema é que o clube está endividado até as orelhas. No fundo é uma empresa mal gerida. Numa empresa mal gerida, num mercado realmente operacional e "sem falhas" poderia ele ganhar tanto?
Os CEOs na banca antes da crise de 2007 (e em outras situações) foram remunerados em valores que não reflectiam em nada a sua capacidade como gestores e como pessoas que deveriam estruturar e guiar as respectivas empresas. O mercado falhou big time.
Assim sendo acho que sem dúvida que a discussão sobre as desigualdades de rendimento pode ser interessante e não é assunto encerrado. Mas não deve ser feita usando chavões como "os 1%". Um % da população activa dos USA são mais de 1 500 000 de pessoas (penso que a população activa são perto de 158 000 000). Isso só nos USA. O problema não está num volume tão grande de pessoas. Muitas dessas realmente operam sobre as regras de mercado, realmente oferecem algo de útil para os outros elementos da sociedade.
Mas sim na questão de se realmente a sociedade precisa duma elite tão rarefeita com tanto capital e de que forma essa quantidade de capital é obtida.
Na lista da Forbes temos 248 pessoas com mais de 5 000 000 000 USD. Dividindo pela população activa temos que serão não os 1%, nem os 0,1% mas sim os 0,000157% . Com mais de 10 000 000 000 USD temos apenas 109 pessoas. A nível mundial a lista indica 125 pessoas com mais de 10 000 000 000 USD.
1645 pessoas controlam assets no valor de 6 400 000 000 000 USD (penso que os valores são de 2014) comparativamente aos 5 400 000 000 000 USD do ano anterior (aceito que uma grande parte da valorização possa ser devida ao bull em vários assets). Não me parece sinal duma sociedade saudável.