O que é irritante neste artigo, é que se trata de uma leitura pessoal da constituição que o autor quer fazer passar por uma demonstração lógica irrefutável.
Das premissas de que parte (impossibilidade de dissolver assembleia) deduz que uma possibilidade é o atual governo manter-se em funções de gestão.
Sendo essa uma possibilidade dá então o salto (i)lógico de que todas as outras mesmo que violem as premissas estão proibidas o que é uma deturpação da lógica.
Sim, é uma "leitura".
O "Direito" não é uma ciência e é particularmente subjectivo como sabemos.
Mas a lógica não é desprezável. Embora eu tenha alguma reservas sobre se esta será a posição que o Presidente da República adoptará.
Repara:
Artigo 195.º - Demissão do Governo
1. Implicam a demissão do Governo:
a) O início de nova legislatura;
b) A aceitação pelo Presidente da República do pedido de demissão apresentado pelo Primeiro-Ministro;
c) A morte ou a impossibilidade física duradoura do Primeiro-Ministro;
d) A rejeição do programa do Governo;
e) A não aprovação de uma moção de confiança;
f) A aprovação de uma moção de censura por maioria absoluta dos Deputados em efectividade de funções.
Art. 186.º - Início e cessação de funções
1. (..)
2. (..)
3. (..)
4. Em caso de demissão do Governo, o Primeiro-Ministro do Governo cessante é exonerado na data da nomeação e posse do novo Primeiro-Ministro.
5. Antes da apreciação do seu programa pela Assembleia da República, ou após a sua demissão, o Governo limitar-se-á à prática dos actos estritamente necessários para assegurar a gestão dos negócios públicos.
Artigo 172.º - Dissolução
1. A Assembleia da República não pode ser dissolvida nos seis meses posteriores à sua eleição, no último semestre do mandato do Presidente da República ou durante a vigência do estado de sítio ou do estado de emergência.
2. (..)
3. A dissolução da Assembleia não prejudica a subsistência do mandato dos Deputados, nem da competência da Comissão Permanente, até à primeira reunião da Assembleia após as subsequentes eleições.
Artigo 153.º - Início e termo do mandato
1. O mandato dos Deputados inicia-se com a primeira reunião da Assembleia da República após eleições e cessa com a primeira reunião após as eleições subsequentes, sem prejuízo da suspensão ou da cessação individual do mandato.
2. (..)
Ou seja, o que estes artigos dizem, é que
- uma vez um Primeiro-Ministro demitido, este entra automaticamente em Gestão até à data de nomeação e posse de um novo Primeiro-Ministro.
- A Assembleia da República não pode ser dissolvida porque estamos nos 6 meses a seguir às eleições. Logo, os deputados actuais são obrigados a manter-se. Essa dissolução só poderá ser realizada após o dia 04 de Abril de 2016.
- A dissolução da Assembleia da República implica a convocação de Eleições e essa dissolução não prejudica a continuação do mandato dos Deputados nem da competência da Comissão Permanente até à primeira reunião da Assembleia após as subsequentes eleições.
Onde eu acho que a interpretação pode falhar é que pelo artigo 187.º:
Artigo 187.º - Formação
1. O Primeiro-Ministro é nomeado pelo Presidente da República, ouvidos os partidos representados na Assembleia da República e tendo em conta os resultados eleitorais.
Não há nada que diga que não se pode aplicar este artigo, após as eleições e em momento diferente. Ou seja, pode haver uma leitura que permite a aplicação do Art. 187, após a existência do Art. 195 e mesmo com a existência em funções de um Governo em Gestão.
Mas também não existe nada que dê "instruções" ao Presidente da República que após a demissão de um Governo, este terá que convidar alguém dentro do Parlamento.
Eu percebi isso, o que não concordo é que o governo manter-se em gestão é a única solução e não me parece que isso tenha a ver com leituras subjectivas mas é simples lógico.
O que está claro é que chumbo do programa implica demissão
e
impossibilidade de dissolver a assembleia nos proximos 5 meses neste caso por por dois motivos, o final de mandato do PR e a impossibilidade de dissolver a assembleia antes de completar 6 meses de legislatura.
É também claro que um governo demissionário mantem-se em funções (gestão) até ser exonerado o que acontece com nomeação do novo PM. Não são definidos prazos portanto pode manter-se em funções 1 semana, 1 mês ou 9 meses.
Não havendo prazos definidos a solução aventada pelo prof de direito é uma solução possivel e constitucional.
Agora o facto de essa ser uma possibilidade não permite deduzir (usando a informação nos artigos) que é a única solução constitucional.