Acho que convinha, nestes momentos, reflectir um pouco e tentar perceber o que é o racismo. Porque muitas vezes, confunde-se racismo com nazismo com com discriminação (para mais, e para, a meu ver, um pouco menos).
Vamos por partes, e começando pela diferença entre nazismo e racismo, e o Daniel Oliveira tem um bom artigo recente no Expresso onde explica, com dados e estatísticas para quem esteja de mente aberta para tentar perceber, porque é que Portugal, em geral obviamente e não na globalidade e totalidade, e comparando com outros países da Europa, é um país racista. Racismo não é querer eliminar todas as pessoas de outras raças, como tentou fazer Hitler, apesar de ser um requisito-base para sentir essa vontade. Racismo é o sentimento base. Racismo é simplesmente achar que uma pessoa, apenas por ser de outra raça ou etnia, é inferior em alguma qualidade, seja civilidade, inteligência, jeito para alguma coisa, etc. Isso é racismo.
Agora, voltando à diferença entre racismo e discriminação, o racismo tem um peso histórico. Os negros não escravizaram os brancos durante séculos como os brancos fizeram com os negros. Pode ter acontecido entre negros e outros negros, entre brancos e outros brancos, mas nestas situações a questão era outra diferença, por vezes étnica, mas raramente racial. Não era a cor da pele diferente que justificava alguém ser escravizado, era rivalidade tribal, era violência pura em contexto de vitória militar, etc. Não era racismo. Por isso é que se um negro disser que os brancos não têm jeito para correr, é uma afirmação discriminatória, mas não tem o peso histórico do racismo. Se uma Isabel dos Santos ou outro empresário negro for contratar trabalhadores e escolher só negros, mesmo quando tem à disposição brancos com mais capacidades, apenas por causa da cor da pele, estamos perante uma injusta discriminação racial, mas é uma banalização da palavra "racismo" associa-la a esta atitude porque não tem o peso histórico de séculos que tem o racismo da civilização caucasiana, que foi a dominante durante séculos, sobre os negros escravizados, e que ainda hoje se mantém entranhada. Por exemplo, ainda hoje ouço dizer que as ex-colónias só perderam com o 25 de Abril porque eles, os pretos, não sabem tomar conta deles mesmos. Isto é racismo.
E é esse racismo que vem ao de cima, normalmente, em situações de ódio para com uma pessoa de outra raça que historicamente foi vista como inferior (caso Marega), em situações em que pessoas de outras raças se tornam incómodas, mesmo que cumprindo a lei (caso Joacine), situações em que há de facto crimes provocados por pessoas de outras raças e que se julga, por isso, logo a raça inteira em vez das pessoas concretas, ao contrário do que acontece com brancos, ou simples casos em que as pessoas de outras raças não se satisfazem por ser apenas pedreiros ou empregadas domésticas, e tentam ser algo mais a nível profissional, e isso é quase visto como uma perda de estatuto por parte do cidadão branco quando tem um negro em concorrência.
E pode até ter havido outros racismos históricos por esse mundo fora, certamente houve, com aborígenes, com índios, com uigures escravizados pelos chineses durante milénios, mas em Portugal interessa o racismo que cá se sente, e esse é essencialmente o racismo para com os negros e a rejeição etnica para com os ciganos. E para resolver este problema, convém começar por aceitar que ele existe, compreender as razões da sua existência e tentar perceber se fazem realmente sentido em pleno século XXI.