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« em: 2012-10-18 14:00:15 »
Um conto lusitano
O meu amigo Costa
Vou-vos contar a história do meu amigo Costa.
O Costa vive em Portugal, mas tem a residência oficial aqui ao lado em Espanha.
O Costa tem destas coisas. Vá-se lá saber porquê, é um tipo estranho, mas é um tipo muito bem formado e com um carácter sem igual.
Conheço o Costa de longa data e por vezes vamos almoçar aos ‘bifes’, ali para os lados da Parede.
Um destes dias, como já não o via há algum tempo, desafiei-o para mais um dos nossos almoços.
O Costa sempre foi um aluno mediano, para o bom, e nunca chumbou nenhum ano na escola, nem na faculdade.
O Costa foi estudante, licenciou-se em engenharia, foi trabalhador estudante durante a faculdade e fez uma pós graduação em gestão, em prestigiosa universidade católica.
Foi trabalhar para uma grande empresa privada, mas não ficou por lá muito tempo. Aquilo não era bem para ele. Foi trabalhar para uma pequena empresa, onde se dedicou e chegou ao topo.
A empresa atravessou várias fases, cresceu, chegou a empregar mais de uma dezena de pessoas, encolheu, mas lá se foi aguentando, sempre gerida de forma muito conservadora. O Costa não dava passada maior do que a perna.
Nas grandes empresas ser um bom gestor é fácil, mas é nas pequenas empresas que se vê a qualidade e a fibra do gestor. Para uma pequena empresa conseguir navegar, é necessário que o gestor seja excepcional, muito bom mesmo.
O Costa sempre muito trabalhador e empenhado, tecnicamente muito competente, é um daqueles empresários que os nossos políticos tanto mimam. Até o Presidente da República fala destes Homens, aquele tipo de pessoa que cria e dá emprego e que gera riqueza, modesta, claro a dimensão não é grande, mas gera riqueza.
Homem habituado ao mundo, quer pelas viagens (o que ele gosta de viajar!), quer pelo fazer do mundo dos negócios.
Por tudo isto, muito me intrigou o Costa viver em Portugal, ali para a Costa da Guia em Cascais, mas ter residência em Espanha.
Por entre duas imperiais, uns tremoços e o famoso bife, lá lhe fui perguntando: Ó Costa mas o que é que tu fazes agora? Nada!
Nada?! Fiquei perplexo. Como nada?
Nada! Bom, sempre vou viajando, lendo muito e tomando conta do que entesourei.
O Costa sempre manteve a empresa com muito trabalho, ele até costumava dizer: “oito escritório, oito casa”. Chegava ao escritório antes das oito da manhã e só voltava a casa por volta das oito da noite.
Ao longo de muitos anos amealhou um património razoável, que foi sempre investindo e reinvestindo, até que hoje gere um respeitável pé-de-meia. Aquilo dá para ele viver.
Mas ele lá se explicou. A empresa cada vez tinha mais dificuldades, os impostos eram cada vez maiores, a burocracia do Estado aumentava na mesma proporção. Para pagar aos funcionários 100, tinha que entregar ao Estado 23,75 e depois o funcionário ainda entregava ao Estado mais 46,5 (11 da segurança social e 35,5 de irs). Dos 123,75 que o Costa pagava o pessoal só recebia 53,50!!! E ainda falavam que no orçamento de estado, ainda iam aumentar os impostos e taxas. NÃO, CHEGA!
Por isso fechei a tasca, desabafava o Costa. Ainda quis vender mas não havia quem me quisesse comprar.
Paguei tudo ao pessoal e fechei a porta.
Agora deixei as preocupações, já não acordo durante a noite sobressaltado, preocupado com o dinheiro para os salários, durmo que nem o Anjos, aquele nosso amigo que sempre soube viver sem preocupações.
Para já mudei a minha residência para Espanha, onde pago 21% de imposto sobre os meus rendimentos de dividendos e juros. Investir em Portugal é que nem pensar.
O Costa lá ia dizendo que o que gostava mesmo era de viver aqui em Portugal, mas para residir nem pensar, e muito menos trabalhar.
O funcionalismo público, em particular a autoridade tributária, vê-nos como bandidos e actuam antes que possamos sequer apresentar qualquer contraditório, assim não vale a pena correr riscos. Nós é que pagamos o salário a toda esta gente, aos nossos funcionários directamente e aos do Estado indirectamente. É que isto cansa. Por isso fechei a tasca e agora quero é não fazer nada. É difícil não fazer nada, mas é isso que eu quero, dizia o Costa com ar decidido.
Deixei o Costa, fui para casa, deitei-me no sofá e pus-me a pensar.
Vêm aí aumento de impostos, greves dos funcionários e depois os Juízes de um qualquer tribunal ainda podem vir dizer que esta receita não pode ser. Virá outra receita com ainda mais impostos. Este ano o défice vai descer de 6% para 4,5% e é o que se viu. Para o ano tem que descer de 4,5% para 2,5%, ainda vai ser pior.
E se outros fizerem isto não vai haver empregos, nem irs para taxar, nem salário para os juízes...
Também eu vou fechar a tasca.
Tranquilo, em Outubro 2012