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Fisco tem atrasado o pagamento a muitos contribuintes que ganham processos em tribunal. Contribuintes que ganham processos fiscais podem ficar anos à espera dos pagamentos do Estado, dizem os fiscalistas. A alternativa é recorrer novamente aos tribunais.
A 15 de Junho de 2014, um tribunal anulou uma liquidação de cerca de 600 mil euros que o Fisco tinha feito a uma empresa. Como a empresa tinha pago o valor em questão, o Estado tem de devolver o montante e com juros. Mas o dinheiro ainda não foi entregue, apesar de o prazo para o Estado o fazer ter terminado em Setembro de 2014. Só em juros indemnizatórios a contabilização já ultrapassou os 25 mil euros.
Este é um exemplo dos atrasos nos pagamentos que o Estado tem de fazer aos contribuintes quando estes ganham processos em tribunal, segundo os fiscalistas ouvidos pelo Diário Económico. "O Estado, que é tão célere a penhorar, tem de cumprir também as suas sentenças", afirma o ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Vasco Valdez. "O contribuinte é esmagado e o Estado não paga", acusa. "Está atingir sinais de total desrespeito pelos contribuintes", alerta. A alternativa é colocar nova acção nos tribunais, sobrecarregando-os novamente, explicam os fiscalistas.
O Ministério das Finanças não forneceu dados sobre o tempo médio de pagamento aos contribuintes, nem actualizou o número de processos que ganha em tribunal. Contudo, dados do Governo de anos anteriores revelam que, em primeira instância, já ganha mais processos em tribunal do que perde.
Os prazos que têm de ser cumpridos
A lei dá 30 dias, depois de a sentença ter transitado em julgado, para que o Estado cumpra de forma voluntária as decisões que impliquem o pagamento de quantia certa, como o reembolso do imposto indevidamente pago num processo que o contribuinte acabou por vencer, por exemplo.
Por outro lado, o fiscalista Samuel Fernandes de Almeida explica que a lei estabelece um outro prazo de três meses para o cumprimento de decisões que determinem a reposição da legalidade em função da anulação de um acto administrativo - é o caso da anulação de uma liquidação que obrigue à reposição e alteração do reporte de prejuízos. Repor a legalidade tributária implica repor a situação tributária como se não tivesse ocorrido o acto que foi anulado pelo tribunal. Assim, e além do reembolso do imposto pago indevidamente, o tribunal pode obrigar o Estado a pagar juros moratórios ou indemnizatórios.
Os fiscalistas ouvidos, no entanto, são unânimes e asseguram que estes prazos não são cumpridos pelo Estado e a situação ocorre também com as decisões dos processos de arbitragem tributária - instrumento criado para tentar aliviar os tribunais e cujo prazo de decisão é mais rápido do que o que se verifica nos tribunais. O ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Rogério Fernandes Ferreira, também identifica o problema: a demora no cumprimento das decisões judiciais "tende a ser significativa, em especial, nos processos cujo montante é mais elevado".
Fonte que não quis ser identificada aponta que "o Estado não paga e, quando o faz, muitas vezes não paga os juros devidos", obrigando os contribuintes a interpor novo processo para o pagamento dos juros.
A mesma fonte explica que há três problemas que podem agravar os atrasos: o tempo que os funcionários, que representam o Estado, demoram a comunicar a sentença, os atrasos no serviço que emite o documento para pagamento e os atrasos dos serviços que fazem de facto os pagamentos aos contribuintes.
Para o fiscalista Samuel Fernandes de Almeida, o cenário piorou desde o terceiro trimestre do ano passado. O especialista defende que "apesar do incumprimento de decisões judiciais poder determinar a responsabilidade civil, disciplinar e mesmo criminal dos funcionários que ilegitimamente não executem decisões judiciais condenatórias, trata-se de uma prática corrente da nossa Administração" que "acaba por efectuar uma gestão de tesouraria à custa dos contribuintes".
Mais processos em tribunal
Perante o incumprimento do Estado, os contribuintes podem colocar novas acções em tribunal: as chamadas acções judiciais de execução de julgado, que devem ser interpostas no prazo máximo de seis meses a contar do fim do prazo legal de execução voluntária. "Isto aumenta, naturalmente, a litigância obrigando o contribuinte a um novo processo judicial para garantir os efeitos da primeira decisão", critica Rogério Fernandes Ferreira.
O fiscalista Silvério Mateus assinala que nos últimos anos o Estado tem visto o seu poder de intervenção na cobrança de impostos reforçado e esperava-se que os direitos dos contribuintes também fossem reforçados. "Mas não é isso o que tem acontecido", adverte. E há vários exemplos que o confirmam como o que acontece, "com frequência", em que "as sentenças dos tribunais que dão razão aos contribuintes não são cumpridas dentro dos prazos legais para esse efeito".
O fiscalista aponta ainda que há situações em que os serviços fiscais avançam com liquidações e penhoras "que, no mínimo, pisam o risco da legalidade ou são mesmo manifestamente ilegais e quando confrontados com a inconsistência das suas decisões pura e simplesmente dizem para os interessados reclamarem ou irem para os tribunais". "E os tribunais são obviamente sobrecarregados com processos relativos a situações que podiam e deviam ser decididas em sede administrativa", acrescenta.
Questionado o Ministério das Finanças não respondeu às questões colocadas.
Passos elogia funcionários da AT
O primeiro-ministro elogiou ontem os funcionários da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) pelo "prestígio" dado à instituição e salientou a "eficácia" na máquina fiscal portuguesa. Passos Coelho realçou a importância de uma máquina fiscal desenvolvida para que o Estado tenha "condições e recursos" para responder aos problemas do país.